Não, a classe média não vai querer pagar a crise
08 Março 2012 | 23:30
Helena Garrido - Helenagarrido@negocios.pt
O caso da Lusoponte e o ataque do presidente da EDP a mudanças na remuneração excessiva do sector eléctrico são sinais terríveis sobre o nosso futuro. O Governo começa a estar armadilhado e a mostrar que a factura das mudanças vai cair apenas nos bolsos da classe média e dos que não têm poder. A instabilidade social é a próxima ameaça. Porque a esperança se esgota como a paciência. O Governo decidiu desautorizar a Estradas de Portugal me permitir que a Lusoponte recebesse as receitas das portagens em Agosto e a compensação por até ao ano passado não se terem cobrado portagens nesse mês na ponte 25 de Abril. Argumento? "(...) poderia configurar uma violação do exclusivo da Concessão Lusoponte", lê-se no argumentário que mereceu o despacho favorável do secretário de Estado das Obras Públicas. Resultado: a Lusoponte recebe as portagens e a compensação por anteriormente não existirem portagens.A questão central não é se o primeiro- -ministro sabia ou não sabia o que se passava no debate parlamentar de quarta-feira passada, porque mentir, convenhamos, não seria minimamente inteligente. O ponto fundamental é o primeiro-ministro não se declarar posteriormente contra a decisão de pagar duas vezes a mesma coisa à Lusoponte. E, mais grave ainda, é o vice-presidente da bancada do PSD, Luís Menezes, acusar a Estradas de Portugal de ser um "braço armado" do anterior Governo.
Será possível que não se perceba o terrível sinal que este caso dá sobre o que vão ser as renegociações dos contratos de parcerias público-privadas (PPP)? Sem a eliminação das rendibilidades excessivas que os contratos garantem a algumas concessões rodoviárias, os contribuintes portugueses vão continuar a ver parte dos seus impostos a entrarem nos bolsos de empresas que conseguiram contratos milionários com o Estado.
Ao lado das PPP temos o sector da electricidade.
Uma das bandeiras do PSD em campanha eleitoral, como nos primeiros tempos do Governo, foi a defesa da verdade, entendida como total transparência. Pois é isso que se começa a ver cada vez menos.
Os estudos realizados, a pedido da troika, para estimar as rendas excessivas no sector eléctrico deviam estar publicados nos sites do Governo. A bem da transparência e de uma informação que exponha quem está a ganhar quanto e como. Se o tivesse feito, não teria ontem ouvido o presidente da EDP a dizer que não há rendas excessivas. E que é preciso somar uma margem aos valores que foram estimados pela associação ligada à Universidade de Cambridge como sendo a remuneração adequada para os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC). As rendas que estão em causa são tais que levaram um economista como António Mexia a dizer o que sabe que não corresponde à realidade, pondo em causa a sua própria imagem como técnico. Aquilo a que se chama custo médio ponderado do capital (WACC) é calculado já com essa margem de risco que António Mexia reivindica.
O Governo deixou-se armadilhar. Se reduzir as margens excessivas da EDP, corre o risco de perder o dinheiro dos novos accionistas chineses e ameaça as próximas privatizações. Se alterar os contratos das concessões, corre o risco de arrastar para a falência grupos que já estão muito fragilizados. A escolha parece, lamentavelmente, determinada. Tudo ficará na mesma na electricidade e nas PPP. Pagaremos uma factura bastante elevada em impostos, em baixo crescimento económico e, no cenário de terror, em instabilidade social. Esperemos que o Governo nos surpreenda e que todos estes sinais estejam errados.
Será possível que não se perceba o terrível sinal que este caso dá sobre o que vão ser as renegociações dos contratos de parcerias público-privadas (PPP)? Sem a eliminação das rendibilidades excessivas que os contratos garantem a algumas concessões rodoviárias, os contribuintes portugueses vão continuar a ver parte dos seus impostos a entrarem nos bolsos de empresas que conseguiram contratos milionários com o Estado.
Ao lado das PPP temos o sector da electricidade.
Uma das bandeiras do PSD em campanha eleitoral, como nos primeiros tempos do Governo, foi a defesa da verdade, entendida como total transparência. Pois é isso que se começa a ver cada vez menos.
Os estudos realizados, a pedido da troika, para estimar as rendas excessivas no sector eléctrico deviam estar publicados nos sites do Governo. A bem da transparência e de uma informação que exponha quem está a ganhar quanto e como. Se o tivesse feito, não teria ontem ouvido o presidente da EDP a dizer que não há rendas excessivas. E que é preciso somar uma margem aos valores que foram estimados pela associação ligada à Universidade de Cambridge como sendo a remuneração adequada para os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC). As rendas que estão em causa são tais que levaram um economista como António Mexia a dizer o que sabe que não corresponde à realidade, pondo em causa a sua própria imagem como técnico. Aquilo a que se chama custo médio ponderado do capital (WACC) é calculado já com essa margem de risco que António Mexia reivindica.
O Governo deixou-se armadilhar. Se reduzir as margens excessivas da EDP, corre o risco de perder o dinheiro dos novos accionistas chineses e ameaça as próximas privatizações. Se alterar os contratos das concessões, corre o risco de arrastar para a falência grupos que já estão muito fragilizados. A escolha parece, lamentavelmente, determinada. Tudo ficará na mesma na electricidade e nas PPP. Pagaremos uma factura bastante elevada em impostos, em baixo crescimento económico e, no cenário de terror, em instabilidade social. Esperemos que o Governo nos surpreenda e que todos estes sinais estejam errados.
Como Passos Coelho está a alienar a classe média
08 Março 2012 | 23:30
Camilo Lourenço - camilolourenco@gmail.com
Passos Coelho parecia estar a acertar o passo: não cometia "gaffes", acertara no discurso (por exemplo, reiterou à Bloomberg que Portugal não vai pedir mais tempo nem dinheiro) e até ganhara postura de Estado ao comentar o desacerto presidencial. Mas do nada cometeu dois deslizes. Seguidos. O primeiro ao não conduzir a partilha de poderes na gestão de fundos do QREN da melhor forma: não percebeu a incomodidade que se sentia há meses no Ministério da Economia e sujeitou Santos Pereira a um facto consumado. Pior, deixou passar para o exterior a ideia de graves divisões no Governo. O segundo deslize (negar no Parlamento o duplo pagamento à Lusoponte) foi ainda mais grave: mostrou que o Governo não tem controlo das contas públicas. Veja-se as declarações contraditórias do secretário de Estado dos Transportes sobre o assunto...
Passos Coelho sempre foi um pouco trapalhão no seu estilo de intervenção política (as "gaffes" antes das eleições legislativas foram o pão-nosso-de-cada-dia...) e fraco no marketing. Mas uma coisa são deslizes enquanto oposição, outra é cometer "gafes" como primeiro-ministro. O episódio no Parlamento serviu para mostrar ao País que o Governo não controla a máquina do Estado: não sabe o que ele paga... nem a quem paga. Ao ponto de induzir em erro o próprio primeiro-ministro.
Numa sociedade fracturada entre uma classe média pressionada pela austeridade e os que não são afectados por ela, passar a ideia de que os sacrifícios não servem para nada é meio caminho andado para o desastre. Além de que abre espaço ao folclore eleitoralista, desviando as atenções dos verdadeiros problemas do País. Assim não vamos lá.
Passos Coelho sempre foi um pouco trapalhão no seu estilo de intervenção política (as "gaffes" antes das eleições legislativas foram o pão-nosso-de-cada-dia...) e fraco no marketing. Mas uma coisa são deslizes enquanto oposição, outra é cometer "gafes" como primeiro-ministro. O episódio no Parlamento serviu para mostrar ao País que o Governo não controla a máquina do Estado: não sabe o que ele paga... nem a quem paga. Ao ponto de induzir em erro o próprio primeiro-ministro.
Numa sociedade fracturada entre uma classe média pressionada pela austeridade e os que não são afectados por ela, passar a ideia de que os sacrifícios não servem para nada é meio caminho andado para o desastre. Além de que abre espaço ao folclore eleitoralista, desviando as atenções dos verdadeiros problemas do País. Assim não vamos lá.
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