por ANSELMO BORGES, in DN, 6-04-2013
São muitos os desafios que se nos apresentam neste século XXI, ao mesmo tempo
com imensas vantagens e imensos riscos.
A sua ordem é um pouco arbitrária, mas começaria pela globalização. Pela
primeira vez, somos verdadeiramente uma "pequena aldeia". Devido às redes de
transportes e comunicações, fluxos de bens, serviços, capitais, conhecimentos e
pessoas, os países e os povos do mundo estão cada vez mais integrados numa
sociedade global. O que vai então significar a globalização: simples
liberalização económica? Que nova configuração vai ter o mundo, com a emergência
dos BRICS e, concretamente, das potências asiáticas, nomeadamente da China e da
Índia? E o que será da Europa, se não caminhar para estruturas federativas?
A globalização contemporânea, a partir de 1945, tem características próprias
e coloca problemas gigantescos, como escreveu A. Sasot Mateus: as tendências
monopolistas do capital, a ausência de mecanismos para a fiscalização da
especulação financeira à escala planetária, o terrorismo global, a falta de
mecanismos efectivos para a resolução dos conflitos internacionais, os problemas
ligados à sustentabilidade mundial, a desintegração da coesão social, o
desemprego, os défices democráticos nas instituições estatais e supra-estatais e
as ameaças à própria democracia devido à subordinação à ditadura financeira,
tráficos ilegais de todo o tipo: armas, pessoas, drogas, órgãos, com máfias
poderosíssimas à mistura, paraísos financeiros que fomentam a falta de
solidariedade e branqueiam capitais de origem duvidosa... No quadro da
globalização, com os problemas globais, é evidente que é necessário pensar numa
governança global.
Este mundo globalizado, é, também por força dos fluxos migratórios, um mundo
multicultural e a questão que se coloca é se vamos entrar num choque de culturas
e civilizações ou se, pelo contrário, seremos capazes de abrir portas para uma
aliança de culturas, mediante o diálogo intercultural e inter-religioso. Como
impedir a homogeneização cultural? Por outro lado, como proteger a diversidade
cultural, sem permitir a lesão dos direitos humanos?
E aí está uma nova cultura: a cibercultura, que o sociólogo M. Castells
estudou, analisando a estrutura da "era da informação" como "sociedade da rede".
As novas gerações nascem sob o impacto das novas tecnologias electrónicas, que
modelam a sua visão da existência e do mundo. Navegando por infindos ecrãs de
textos e imagens, ligando-se em fóruns de discussão e intervenção, trocando
mensagens de simultaneidade generalizada, perdendo a noção do tempo e da
realidade mediante a entrada no virtual, marcando encontros cibersexuais,
experimentam uma nova revolução em curso. Então, que novo tipo de homem, que
nova imagem do corpo, que nova relação com a memória e o tempo? Na relação
universal virtual, não se perde a relação com o outro face a face, mergulhando
na insuportável solidão? E não cresce o perigo de novas formas de exclusão, com
o novo analfabetismo: o cibernético? E no meio de tsunamis de informação, como
analisá-la criticamente e distinguir? E não se ergue um risco maior: o de,
esquecendo a dimensão vertical, sem referências, a Rede transformar-se, na
expressão feliz de João Maria André, num Labirinto?
Outras revoluções estão em curso: a genética e as neurociências - o cérebro é
o infindável novo continente em exploração. Poderemos, com as novas tecnologias,
vir a vencer a dor, o envelhecimento e a própria morte? Assistir-se-á à
transformação da natureza do humano? Caminharemos para o pós--humano e um
transhumanismo, que fazem inclusivamente alguns pensarem na possibilidade de uma
bifurcação da Humanidade? Os novos desafios: manipulação genética, manipulação
da actividade cerebral, investigação em embriões, clonagem, híbridos, criação do
super-homem...
Não se pode deixar de apontar o desafio ecológico, quando o planeta está em
risco e a Humanidade pode deixar de ter futuro.
Poderá esquecer-se o Transcendente, ao menos enquanto questão? E abandonar a
afirmação de Cícero: "res sacra homo" ( o ser humano é realidade sagrada)?
FONTE: http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=3149809&seccao=Anselmo Borges&tag=Opini%E3o - Em Foco&page=-1 |
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