"Porquê?" & "Para quê?"

Impõe-se-me, como autor do blogue, dar uma explicação, ainda que breve, do "porquê" e do "para quê" da sua criação. O título já por si diz alguma coisa, mas não o suficiente. E será a partir dele, título, que construirei esse "suficiente". Vamos a isso! Assim:
Dito de dizer, escrever, noticiar, informar, motivar, explicar, divulgar, partilhar, denunciar, tudo aquilo que tenho e penso merecer sê-lo. Feito de fazer, actuar, concretizar, agir, reunir, construir. Um pressupõe e implica, necessariamente, o outro - «de palavras está o mundo cheio». Se muitos & bons discursos ditos, mas poucas ou nenhumas acções que tornem o mundo, um lugar, no mínimo, suportável para se viver, «olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço», então nada feito!!!

«Para bom entendedor meia palavra basta» - meu dito meu feito, palavras e motivo.





























domingo, 4 de dezembro de 2011

Cultura do DAR-SE

A revista “Visão” de 24 de novembro, com o tema de capa «Quando dar é receber», recolheu «histórias inspiradoras» de figuras públicas que procuram ser solidárias. Alguns dos nove relatos envolvem a participação em atividades realizadas por instituições da Igreja Católica.

A descoberta de capacidades desconhecidas
A experiência de Carminho como voluntária «começou aos 18 anos, por influência de colegas da Universidade Lusíada, fazendo a ronda da noite da Comunidade Vida e Paz [onde também colabora Fernanda Freitas, apresentadora de televisão e presidente portuguesa do Ano Europeu do Voluntariado 2011], distribuindo sopa aos sem abrigo de Lisboa. Carminho dedicava, também, os seus fins de semana à Casa de Saúde Mental do Telhal e às monjas de Belém, onde ajudava nas limpezas. No verão do ano seguinte, partiu em missão de voluntariado, durante dois meses, para Cabo Verde… e a vontade de ajudar os outros nunca mais a abandonou.
“Não sei de onde é que vem essa vontade, que é comum a qualquer ser humano. É como um bicho que se entranha pelo coração adentro e nos faz olhar para as pessoas quase como nossas salvadoras. Porque o voluntariado tem a particularidade de nos iluminar por dentro.”
Foi em busca de alguma luz que partiu para uma volta ao mundo, aos 22 anos, quando terminou o curso de Marketing e Publicidade. Estava confusa, sabia apenas que não queria trabalhar naquela área. Já cantava, “tinha até propostas para gravar um disco”, mas não se sentia preparada para o fazer.
Por isso, agarrou “nuns trocos que tinha juntado com as cantorias” e comprou um bilhete especial, com direito a fazer 15 viagens de avião por pouco mais de dois mil euros. Nas cláusulas, apenas uma condição: nunca poderia voltar para trás. Partiu de mochila às costas, sozinha, com pouco dinheiro no bolso e sem nada organizado. O seu primeiro destino foi a Índia. Bateu à porta das Irmãs da Caridade, em Calcutá, dizendo: “Olá, sou a Carmo, de Portugal…”. Ninguém a esperava mas, antes que pudesse explicar alguma coisa, já a convidavam a entrar e a deitar mãos ao trabalho.
Ali ficou, durante mês e meio, dormindo em dois metros quadrados de chão e cuidando de moribundos. Logo na primeira semana foi recolher idosos abandonados na estação de comboios, que estavam a ser “literalmente comidos por vermes…”. Viu coisas terríveis e teve gente a morrer-lhe nos braços. “Passei a encarar a morte de forma muito diferente”, afirma. “Descobri capacidades em mim que desconhecia, para lidar com as fragilidades do ser humano, com a doença., a higiene… coisas que, às vezes, nos parecem barreiras, mas são mais como canais para chegarmos ao outro. E num sítio onde não conhecemos a língua, aprendi também que são os sorrisos, os gestos, a maneira como agimos que muda tudo”.
Nos 11 meses seguintes, Carminho correu mundo, procurando sempre ser útil: no Camboja esteve um mês a trabalhar num orfanato da Madre Teresa; em Timor-Leste deu aulas de português durante dois meses; no Peru passou outro mês a fazer o levantamento de estragos em aldeias isoladas, nas montanhas, após um terramoto. “Até hoje tenho recolhido frutos pequeninos dessa viagem”, diz, explicando que o desafio “é não esquecer” as lições que aprendeu pelo caminho. Regressou com o coração arrumado e a certeza de que queria dedicar a vida ao fado. “A minha voz é o que tenho de melhor e, se me foi dado este dom, é porque tem de ser partilhado.”»
O templo vivo de Deus são as pessoas
Da freguesia da Vitória, na cidade do Porto, «a vista estende-se pela de S. Nicolau, as duas bem no centro histórico da Invicta, as duas bem no centro da ação deste homem de 69 anos. Há 40 anos que o padre Jardim anda por estas ruas de empedrado incerto, assistindo ao rendilhado das vidas difíceis que as habitam. Não as trocava por nada, nem pela presidência da EAPN Portugal-Rede Europeia Anti-Pobreza, cargo que ocupa há 20 anos, desde a sua criação, e cujo trabalho a Assembleia da República reconheceu ao atribuir-lhe o Prémio de Direitos Humanos 2010.
“A minha maior alegria é trabalhar com esta gente. Mais facilmente deixaria a rede europeia…” Afinal. é naquelas duas paróquias, das mais pobres da cidade pobre, que Jardim Moreira tem a sua “obra”: sete casas dedicadas às crianças, mães adolescentes e velhos. É por estes que saca dinheiro aqui e ali. Ainda recentemente “inventou” um sistema de apadrinhamento – já tem 83 padrinhos e 26 voluntários -, para manter 28 crianças, dos 6 aos 10 anos, num dos seus centros paroquiais. Crianças que não estão abrangidas por qualquer acordo com o centro regional de Segurança Social. “Na rua é que elas não iam ficar”, assegura. “A sociedade civil vai ter de assumir o futuro deste país. Tem de ser corresponsável, porque a segurança dos pobres é também a nossa.”
Há em Jardim Moreira um pouquinho do padre Américo, o obreiro da Casa do Gaiato, contemporâneo de seu pai e visita lá de casa. Mas também do bispo vermelho Dom Hélder Câmara, brasileiro. Não é um rato de sacristia, antes homem da rua. Persegue um sonho: que o cristão “não se sinta chamado apenas a dar esmola” e que as políticas sociais estejam para lá do assistencialismo, da caridade ou da subsídio dependência. A palavra-chave é “partilha”; que cada um “assuma o problema do outro como sendo seu”.
Cedo percebeu que “o Evangelho é amar a Deus no próximo ou então não é”. O padre Jardim é muito claro: “O Cristo que a Igreja celebra e adora no altar é o que está esfarrapado e abandonado na rua.”
Quando iniciou o sacerdócio, em 1969, pediu “uma zona pobre, descristianizada”. O bispo deu-lhe “o pior que tinha”. E se, então, “para ir à Ribeira tinha de ser escoltado”, hoje é amavelmente saudado tanto pelo “senhor doutor” como pela prostituta do bairro. Começou por fazer obras na igreja. “Mas não valeu a pena, as pessoas não vinham.” Então decidiu ir ao encontro das pessoas, fazer o levantamento sociológico. Até alguns anos depois do 25 de abril de 1974, a atitude valeu-lhe o epíteto de comunista e havia quem afirmasse que recebia dinheiro de Moscovo. Mas ele nem 500 escudos tinha para sustentar a paróquia. Meteu-se a caminho da Europa e pediu “como um cego”, mesmo à Caritas belga. Fez assim o primeiro centro de idosos. “Onde está a Igreja? A Igreja é a casa ou são as pessoas? O templo vivo de Deus são as pessoas.”»
De Wall Street para África
«No próximo Natal, quem quiser encontrar Domitília dos Santos terá de procurá-la numa missão das Irmãs da Caridade, algures numa aldeia remota de Moçambique. A gestora de fortunas de Wall Street reserva sempre uma parte das suas férias para fazer voluntariado, inspirada na obra de Madre Teresa de Calcutá. Em países como o Vietname, Honduras, Gana, Haiti e Camboja, dorme no chão, come com a população local, despe-se das frivolidades da vida. Faz voluntariado com doentes terminais em Nova Iorque desde os anos 1980, mas começou a cumprir este ritual anual na Etiópia, em 2000.
“Estive lá oito dias. Ajudei doentes com sida, com lepra, foi uma experiência que me marcou para a vida inteira. Não havia nada, as crianças não tinham comida, quanto mais brinquedos, e eu puxei pela cabeça e fui recordar as brincadeiras que fazia em pequena, no Algarve, como o jogo da macaca… a alegria que me dava ver o sorriso dessas meninas quando me encontravam todas as manhãs é indescritível.”
O que a motiva a trocar o mundo da alta finança pela dos mais pobres? “Não tenho marido nem filhos e pode até ser um pouco egoísta, mas dá-me muita paz de espírito”, explica. “Sinto que estou a fazer a diferença na vida de alguém. Faz-me apreciar tudo o que tenho no meu dia a dia: a água que bebo, o sabonete que uso, a música que ouço… É como um spa para a alma.”»

Patrícia Fonseca (com Cesaltina Pinto)
In Visão, 24.11.2011
01.12.11


in http://www.snpcultura.org/cultura_do_dar_se.html

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