"Porquê?" & "Para quê?"

Impõe-se-me, como autor do blogue, dar uma explicação, ainda que breve, do "porquê" e do "para quê" da sua criação. O título já por si diz alguma coisa, mas não o suficiente. E será a partir dele, título, que construirei esse "suficiente". Vamos a isso! Assim:
Dito de dizer, escrever, noticiar, informar, motivar, explicar, divulgar, partilhar, denunciar, tudo aquilo que tenho e penso merecer sê-lo. Feito de fazer, actuar, concretizar, agir, reunir, construir. Um pressupõe e implica, necessariamente, o outro - «de palavras está o mundo cheio». Se muitos & bons discursos ditos, mas poucas ou nenhumas acções que tornem o mundo, um lugar, no mínimo, suportável para se viver, «olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço», então nada feito!!!

«Para bom entendedor meia palavra basta» - meu dito meu feito, palavras e motivo.





























domingo, 9 de setembro de 2012

PALAVRA de DOMINGO: há que contextualizá-la para bem a entender e melhor vivê-la!!!

EVANGELHOMc 7,31-37

Naquele tempo,
Jesus deixou de novo a região de Tiro
e, passando por Sidónia, veio para o mar da Galileia,
atravessando o território da Decápole.
Trouxeram-Lhe então um surdo que mal podia falar
e suplicaram-Lhe que impusesse as mãos sobre ele.
Jesus, afastando-Se com ele da multidão,
meteu-lhe os dedos nos ouvidos
e com saliva tocou-lhe a língua.
Depois, erguendo os olhos ao Céu,
suspirou e disse-lhe:
«Effathá», que quer dizer «Abre-te».
Imediatamente se abriram os ouvidos do homem,
soltou-se-lhe a prisão da língua
e começou a falar correctamente.
Jesus recomendou que não contassem nada a ninguém.
Mas, quanto mais lho recomendava,
tanto mais intensamente eles o apregoavam.
Cheios de assombro, diziam:
«Tudo o que faz é admirável:
faz que os surdos oiçam e que os mudos falem».
AMBIENTE
Na fase final da “etapa da Galileia”, multiplicam-se as reacções negativas contra Jesus e contra o seu projecto, apesar do rasto de vida nova que Ele vai deixando pelas aldeias e cidades por onde passa. As últimas discussões com os fariseus e com doutores da Lei a propósito de questões legais e da “tradição dos antigos” (cf. Mc 7,1-23) são uma espécie de gota de água que faz Jesus abandonar o território judeu e refugiar-Se em território pagão.
É nesse contexto que Marcos fala de uma viagem pela Fenícia, que leva Jesus a passar pelos territórios de Tiro e de Sídon – cidades da faixa costeira oriental do mar Mediterrâneo, no actual Líbano (cf. Mc 7,24). No regresso dessa incursão pela Fenícia, Jesus teria dado uma longa volta pelo território pagão da Decápole (cf. Mc 7,31). A Decápole (“dez cidades”) era o nome dado ao território situado na Palestina oriental, estendendo-se desde Damasco, ao norte, até Filadélfia, ao sul. O nome servia para designar uma liga de dez cidades, que se formou depois da conquista da Palestina pelos romanos, no ano 63 a.C.. As “dez cidades” que formavam esta liga eram helenísticas e não estavam sujeitas às leis judaicas. As cidades que integravam a Decápole (bem como os territórios circundantes a cada uma dessas cidades) estavam sob a administração do legado romano da Síria. Eram território pagão, considerado pelos judeus completamente à margem dos caminhos da salvação.
É nesse ambiente geográfico e humano que o episódio da cura do surdo-mudo nos vai situar. O gesto de Jesus de curar o surdo-mudo deve ser visto como mais um passo no anúncio desse projecto que Jesus vai propondo por toda a Galileia: o projecto do Reino de Deus.
MENSAGEM
Num lugar não identificado da região da Decápole, Jesus encontrou-Se com um surdo-mudo. As pessoas que trouxeram o surdo-mudo suplicaram a Jesus “que impusesse as mãos sobre Ele” (vers. 32). Na sequência Marcos descreve, com grande abundância de pormenores (alguns bem estranhos), como Jesus curou o doente e lhe deu a possibilidade de comunicar.
Contudo, depois de ler a narração deste episódio, ficamos com a sensação de que Marcos quer muito mais do que contar uma simples cura de um surdo-mudo… A descrição de Marcos, enriquecida com um número significativo de elementos simbólicos, é uma catequese sobre a missão de Jesus e sobre o papel que Ele desenvolve no sentido de fazer nascer um Homem Novo.Vejamos, de forma esquemática, os elementos principais dessa catequese que Marcos apresenta:
1. No centro da cena está Jesus e o surdo-mudo (literalmente, “um surdo que tinha também um problema na fala”). Se a linguagem é um meio privilegiado de comunicar, de estabelecer relação, o surdo-mudo é um homem que tem dificuldade em estabelecer laços, em partilhar, em dialogar, em comunicar. Por outro lado, num universo religioso que considera as enfermidades físicas como consequência do pecado, o surdo-mudo é, de forma notória, um “impuro”, um pecador e um maldito. Finalmente, o surdo-mudo vive no território pagão da Decápole: é provavelmente um desses pagãos que a teologia judaica considerava à margem da salvação.
Na catequese de Marcos, este surdo-mudo representa todos aqueles que vivem fechados no seu mundo, na sua pobre auto-suficiência, de ouvidos fechados às propostas de Deus e de coração fechado à relação com os outros homens. Representa também aqueles que a teologia oficial considerava pecadores e malditos, incapazes de estabelecer uma relação verdadeira com Deus, de escutar a Palavra de Deus e de viver de forma coerente com os desafios de Deus. Representa ainda esses “pagãos” que os judeus desprezavam e que consideravam completamente alheados dos caminhos da salvação.
2. O encontro com Jesus transforma radicalmente a vida desse surdo-mudo. Jesus abre-lhe os ouvidos e solta-lhe a língua (vers. 35), tornando-o capaz de comunicar, de escutar, de falar, de partilhar, de entrar em comunhão. Na história deste surdo-mudo, Marcos representa a missão de Jesus, que veio para abrir os ouvidos e os corações dos homens, quer à Palavra e às propostas de Deus, quer à relação e ao diálogo com os outros homens. O episódio lembra-nos imediatamente o anúncio de Isaías na primeira leitura: “Tende coragem, não temais. Aí está o vosso Deus; vem para fazer justiça e dar a recompensa; Ele próprio vem salvar-vos. Então se abrirão os olhos dos cegos e se desimpedirão os ouvidos dos surdos; então o coxo saltará como um veado e a língua do mudo cantará de alegria” (Is 35,4-6). Jesus é efectivamente o Deus que veio ao encontro dos homens, a fim de os libertar das cadeias do egoísmo, do comodismo, da auto-suficiência, dos preconceitos religiosos que impedem a relação, o diálogo, a comunhão com Deus e com os irmãos.
3. Aparentemente, não é o surdo-mudo que tem a iniciativa de se encontrar com Jesus (“trouxeram-Lhe um surdo que mal podia falar”; “suplicaram-Lhe que lhe impusesse as mãos sobre ele” – vers. 32). O surdo-mudo, instalado e acomodado a essa vida sem relação, não sente grande necessidade de abrir as janelas do seu coração para o encontro e para a comunhão com Deus e com os irmãos. É preciso que alguém o traga, que o apresente a Jesus, que o empurre para essa vida nova de amor e de comunhão. É esse o papel da comunidade cristã… Os que já descobriram Jesus, que se deixaram transformar pela sua Palavra, que aceitaram segui-l’O, devem dar testemunho dessa experiência e desafiar outros irmãos para o encontro libertador com Jesus.
4. A sós com o surdo-mudo, Jesus realiza gestos significativos: mete-lhe os dedos nos ouvidos, faz saliva e toca-lhe com ela a língua (vers. 33). Tocar com o dedo significava transmitir poder; a saliva transmitia, pensava-se, a própria força ou energia vital (equivale ao sopro de Deus que transformou o barro inerte do primeiro homem num ser dotado de vida divina – cf. Gn 2,7). Assim, Jesus transmitiu ao surdo-mudo a sua própria energia vital, dotando-o da capacidade de ser um Homem Novo, aberto à comunhão com Deus e à relação com os outros homens.
5. O gesto de Jesus de levantar os olhos ao céu (vers. 34) deve ser entendido como um gesto de invocação de Deus. Para Jesus, os grandes momentos de decisão e de testemunho são sempre antecedidos de um diálogo com o Pai. Dessa forma, torna-se evidente a ligação estreita entre Jesus e o Pai, entre a acção que Jesus cumpre no meio dos homens e os projectos do Pai. Os gestos de Jesus no sentido de dar vida ao homem, de o libertar do seu fechamento e da sua auto-suficiência, de o abrir à relação, são gestos que têm o aval do Pai e que se inserem no projecto salvador do Pai.
6. De acordo com Marcos, Jesus teria pronunciado a palavra “effathá” (“abre-te”), quando abriu os ouvidos e desatou a língua do surdo-mudo. Não se trata de uma fórmula mágica, com especiais virtudes curativas… É um convite ao homem fechado no seu mundo pessoal a abrir o coração à vida nova da relação com Deus e com os irmãos. É um convite ao surdo-mudo a sair do seu fechamento, do seu comodismo, do seu egoísmo, da sua instalação, para fazer da sua vida uma história de comunhão com Deus e de partilha com os irmãos. O processo de transformação do surdo-mudo em Homem Novo não é um processo em que só Jesus age e onde o homem assume uma atitude de passividade; mas é um processo que exige o compromisso activo e livre do homem. Jesus faz as propostas, lança desafios, oferece o seu Espírito que transforma e renova o coração do homem; mas o homem tem de acolher a proposta, optar por Jesus e abrir o coração aos desafios de Deus.
7. No final do relato da cura do surdo-mudo, as testemunhas do acontecimento dizem a propósito de Jesus: “tudo o que Ele faz é admirável” (vers. 37). A expressão parece ser um eco de Gn 1,31 (“Deus, vendo a sua obra, considerou-a muito boa”). Ao enlaçar este relato com o relato da criação do homem, Marcos está a dar-nos a chave de leitura para entender a obra de Jesus: a acção de Jesus no sentido de abrir o coração dos homens à comunhão com Deus e ao amor dos irmãos é uma nova criação. Dessa acção nasce um Homem Novo, uma nova humanidade. Esse Homem Novo é a “admirável” criação de Deus, o homem na plenitude das suas potencialidades, criado para a vida eterna e verdadeira.
ACTUALIZAÇÃO
• O Evangelho deste domingo garante-nos, uma vez mais, que o Deus em quem acreditamos é um Deus comprometido connosco, continuamente apostado em renovar o homem, em transformá-lo, em recriá-lo, em fazê-lo chegar à vida plena do Homem Novo. Este Deus que abre os ouvidos dos surdos e solta a língua dos mudos é um Deus cheio de amor, que não abandona os homens à sua sorte nem os deixa adormecer em esquemas de comodismo e de instalação; mas, a cada instante, vem ao seu encontro, desafia-os a ir mais além, convida-os a atingir a plenitude das suas possibilidades e das suas potencialidades. Não esqueçamos esta realidade: na nossa viagem pela vida, não caminhamos sozinhos, arrastando sem objectivo a nossa pequenez, a nossa miséria, a nossa debilidade; mas ao longo de todo o nosso percurso pela história, o nosso Deus vai ao nosso lado, apontando-nos, com amor, os caminhos que nos conduzem à felicidade e à vida verdadeira.
• O surdo-mudo, incapaz de escutar a Palavra de Deus, representa esses homens que vivem fechados aos projectos e aos desafios de Deus, ocupados em construir a sua vida de acordo com esquemas de egoísmo, de orgulho, de auto-suficiência, que não precisam de Deus nem das suas propostas. O homem do nosso tempo já nem gasta tempo a negar Deus; limita-se a ignorá-l’O, surdo aos seus desafios e às suas indicações. O que é que as propostas de Deus significam para mim? Dou ouvidos aos apelos e desafios de Deus, ou aos valores e propostas que o mundo me apresenta? Quando tenho que fazer opções, o que é que conta: as propostas de Deus ou as propostas do mundo?
• O surdo-mudo representa também aqueles que não se preocupam em comunicar, em partilhar a vida, em dialogar, em deixar-se interpelar pelos outros… Define a atitude de quem não precisa dos irmãos para nada, de quem vive instalado nas suas certezas e nos seus preconceitos, convencido de que é dono absoluto da verdade. Define a atitude daquele que não tem tempo nem disponibilidade para o irmão; define a atitude de quem não é tolerante, de quem não consegue compreender os erros e as falhas dos outros e não sabe perdoar. Uma vida de “surdez” é uma vida vazia, estéril, triste, egoísta, fechada, sem amor. Não é nesse caminho que encontramos a nossa realização e a nossa felicidade…
• O surdo-mudo representa ainda aqueles que se fecham no egoísmo e no comodismo, indiferentes aos apelos do mundo e dos irmãos. Somos surdos quando escutamos os gritos dos injustiçados e lavamos as nossas mãos; somos surdos quando toleramos estruturas que geram injustiça, miséria, sofrimento e morte; somos surdos quando pactuamos com valores que tornam o homem mais escravo e mais dependente; somos surdos quando encolhemos os ombros, indiferentes, face à guerra, à fome, à injustiça, à doença, ao analfabetismo; somos surdos quando temos vergonha de testemunhar os valores em que acreditamos; somos surdos quando nos demitimos das nossas responsabilidades e deixamos que sejam os outros a comprometer-se e a arriscar; somos surdos quando calamos a nossa revolta por medo, cobardia ou calculismo; somos surdos quando nos resignamos a vegetar no nosso sofá cómodo, sem nos empenharmos na construção de um mundo novoUma vida comodamente instalada nesta “surdez” descomprometida é uma vida que vale a pena ser vivida?
• A missão de Cristo consistiu precisamente em abrir os olhos aos cegos e desatar a língua dos mudos… Ele veio abrir-nos à relação com Deus, ao amor dos irmãos, ao compromisso com o mundo. Quem adere a Cristo e quer segui-l’O no caminho do amor a Deus e da entrega aos irmãos, não pode resignar-se a viver fechado a Deus e ao mundo. O encontro com Cristo tira-nos da mediocridade e desperta-nos para o compromisso, para o empenho, para o testemunho. Leva-nos a sair do nosso isolamento e a estabelecer laços familiares com Deus e com todos os nossos irmãos, sem excepção.
• O surdo-mudo da nossa história foi trazido e apresentado a Jesus por outras pessoas. O pormenor lembra-nos o nosso papel no sentido de fazer a ponte entre os irmãos que vivem prisioneiros da “surdez” e a proposta libertadora de Jesus Cristo. Não podemos ficar de braços cruzados quando algum dos nossos irmãos se instala em esquemas de fechamento, de egoísmo, de auto-suficiência; mas, com o nosso testemunho de vida, temos de lhe apresentar essa proposta libertadora que Cristo quer oferecer a todos os homens.
• Antes de curar o surdo-mudo, Jesus “ergueu os olhos ao céu”. O gesto de Jesus recorda-nos que é preciso manter sempre, no meio da acção, a referência a Deus. É necessário dialogarmos continuamente com Deus para descobrir os seus projectos, para perceber as suas propostas, para ser fiel aos seus planos; é preciso tomar continuamente consciência de que é Deus que age no mundo através dos nossos gestos; é preciso que toda a nossa acção encontre em Deus a sua razão última: se isso não acontecer, rapidamente a nossa acção perde todo o sentido.

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